9 de Dezembro de 2025

Entrevista a Diana Lopes: “Portugal deve acreditar mais nas suas capacidades” | Jornal de Negócios

No âmbito da parceria entre o Conselho da Diáspora Portuguesa e o Negócios, Diana Lopes, Diretora de Projetos Hospitalares para a América do Sul na VAMED, e Conselheira do Núcleo Regional de África, foi entrevistada para o Jornal de Negócios, onde abordou o seu percurso profissional e identificou oportunidades competitivas para Portugal, a sua economia, empresas e empresários em geral.

1 – O QUE A LEVOU A SAIR DE PORTUGAL?

A vontade de crescer profissionalmente e de explorar novas culturas foi determinante para a minha saída de Portugal. Desde cedo tive contacto com o mundo internacional e, após terminar o curso de Engenharia Civil na FEUP, decidi integrar o programa INOV Contacto, tendo sido colocada na Roménia. Mais tarde, com o impacto da crise económica de 2010-2012 em Portugal, procurei novas oportunidades no estrangeiro, o que me levou a fixar em África. Mais recentemente, o espírito de missão e os desafios globais na área da saúde conduziram-me até à Guiana.

2 – QUE VANTAGENS OU DESVANTAGENS LHE TROUXE O FACTO DE SER PORTUGUESA?

Ser portuguesa tem sido, na maioria das vezes, uma vantagem. Em ambientes como o Gana, o profissionalismo, a adaptabilidade e a ética de trabalho dos portugueses são muito valorizados. Já na Guiana, há uma ligação histórica curiosa: muitos guianenses são descendentes de portugueses, especialmente da Ilha da Madeira, e mantêm ainda hoje laços culturais, linguísticos e afetivos com Portugal. Embora atualmente haja poucos portugueses a trabalhar no país, noto um interesse crescente. Esse reconhecimento e familiaridade com Portugal abrem portas e criam empatia imediata, o que facilita a integração e a colaboração. A nossa presença desperta curiosidade positiva, o que pode ser um trunfo para quem quer iniciar atividade profissional na região.

3 – QUE OBSTÁCULOS TEVE DE SUPERAR E COMO O FEZ?

A adaptação a diferentes realidades culturais e administrativas foi um desafio constante. Em África, por exemplo, os processos e o ritmo de trabalho são muito diferentes dos europeus. Em contextos como a Guiana, é necessário lidar com limitações estruturais e de recursos. Superei estes obstáculos com empatia, escuta ativa e uma forte capacidade de adaptação. Também aprendi a liderar equipas multiculturais, respeitando contextos locais e promovendo soluções colaborativas.

4 – O QUE MAIS ADMIRA NO PAÍS EM QUE ESTÁ?

Na Guiana admiro a multiculturalidade, onde diferentes etnias, religiões e tradições convivem em harmonia. A riqueza natural, com florestas tropicais, rios majestosos e uma biodiversidade impressionante, um verdadeiro tesouro nacional, e o espírito resiliente da população. No Gana, onde tive o privilégio de viver por mais de uma década, o que mais me marcou foi o forte sentido de comunidade, a alegria no quotidiano, seja nas cores vibrantes das roupas, nas danças espontâneas ou nos sorrisos generosos que acolhem qualquer visitante. A hospitalidade ganesa e o sentimento de pertença que cria é duradouro e transformador. Ambos os países têm em comum a vontade de evoluir e modernizar-se, sem perder de vista os seus valores, identidades e raízes culturais, o que representa uma oportunidade de colaboração valiosa para profissionais e empresas estrangeiras.

5 – O QUE MAIS ADMIRA NA EMPRESA / ORGANIZAÇÃO EM QUE ESTÁ?

Na VamedWWH admiro a visão estratégica e o compromisso com soluções sustentáveis na área da saúde. A empresa tem um modelo inovador de hospitais modulares, que permite oferecer cuidados médicos avançados em qualquer parte do mundo, com rapidez e eficiência. Trabalhar numa organização com esta missão global, e onde a engenharia portuguesa é valorizada, é altamente motivador.

6 – QUE RECOMENDAÇÕES DARIA A PORTUGAL E AOS SEUS EMPRESÁRIOS E GESTORES?

Portugal deve acreditar mais nas suas capacidades e assumir com convicção o seu lugar no cenário global. Somos um país com base sólida de conhecimento técnico, criatividade e uma resiliência histórica que nos permite adaptar e prosperar em contextos desafiantes. Esta combinação é um ativo estratégico que deve ser valorizado e projetado com ambição. Recomendo aos empresários e gestores portugueses que invistam na internacionalização de forma mais estruturada, com visão a longo prazo e uma abordagem sustentável. Não se trata apenas de exportar produtos ou serviços, mas de construir presença, influencia e parcerias duradouras em mercados externos. A diplomacia económica deve ser encarada como uma ferramenta essencial, capaz de abrir portas, criar pontes e posicionar Portugal como um parceiro relevante e confiável. A criação de alianças com entidades públicas e privadas, tanto nacionais como internacionais, pode acelerar processos de entrada e consolidação em novos mercados.

Um recurso valioso, e muitas vezes subaproveitado, é a diáspora portuguesa. Presente nos quatro cantos do mundo, a nossa comunidade é formada por profissionais qualificados, empreendedores visionários e líderes com conhecimento profundo dos mercados locais. São pessoas que pela sua experiência podem desempenhar papeis chave como facilitadores, embaixadores da cultura portuguesa e pontes entre diferentes realidades económicas e sociais.

Em suma, é tempo de Portugal pensar globalmente, agir estrategicamente e confiar na força das suas pessoas, ideias e valores. O futuro pertence aos que ousam construir pontes e explorar novas fronteiras com coragem e visão.

7 – EM QUE SETORES DO PAÍS ONDE VIVE PODERÃO AS EMPRESAS PORTUGUESAS ENCONTRAR CLIENTES?

Tanto no Gana como na Guiana, há uma procura crescente por soluções que respondam aos desafios do desenvolvimento sustentável e da modernização das infraestruturas, nas áreas da construção, saúde, energias renováveis, educação e tecnologias da informação.

Na construção, há uma necessidade de habitação, infraestruturas urbanas e projetos de engenharia civil que respeitem critérios ambientais e sociais.

Na saúde, a procura de equipamentos médicos, soluções digitais e formação especializada abre espaço para empresas com experiência em inovação e gestão hospitalar.

As energias renováveis, especialmente solar e hídrica, são áreas prioritárias, com incentivos governamentais e clara abertura a parcerias tecnológicas. A educação, por sua vez, requer conteúdos pedagógicos, plataformas digitais e formação de professores, enquanto as tecnologias da informação representam um campo fértil para soluções em conectividade, segurança digital e transformação digital de serviços públicos e privados.

As empresas portuguesas com propostas inovadoras, experiência internacional e compromisso com a capacitação local podem encontrar nestes países parceiros e clientes com grande potencial.

8 – EM QUE SETORES DE PORTUGAL PODERIAM AS EMPRESAS DO PAÍS ONDE ESTÁ QUERER INVESTIR?

Portugal é atrativo para investidores estrangeiros em áreas como o agroalimentar, energias limpas, turismo sustentável, educação e saúde. O ecossistema português de inovação e a sua posição estratégica como porta de entrada para a Europa podem ser bem aproveitados por empresas ganesas ou guianesas que queiram diversificar mercados.

O setor agroalimentar português destaca-se pela qualidade dos seus produtos, práticas agrícolas sustentáveis e crescente aposta na exportação. As energias limpas, com forte investimento em solar, eólica e hídrica, refletem o compromisso do país com a transição energética e abrem espaço para parcerias tecnológicas. O turismo sustentável, por sua vez, beneficia da diversidade natural e cultural de Portugal, sendo uma área promissora para modelos de negócio que valorizem a autenticidade e o impacto positivo nas comunidades locais.

A posição geográfica de Portugal, como porta de entrada para a Europa e plataforma de ligação com África e América Latina, é uma vantagem estratégica que pode ser bem aproveitada por empresas ganesas ou guianesas interessadas em diversificar mercados, estabelecer parcerias comerciais e ganhar escala internacional.

9 – QUAL A VANTAGEM COMPETITIVA DO PAÍS EM QUE ESTÁ QUE PODERIA SER REPLICADA EM PORTUGAL?

Na Guiana, a proximidade com mercados como os EUA, Canadá e Caribe é uma vantagem relevante. No Gana, a agilidade nas decisões e a informalidade no trato facilitam parcerias. Portugal poderia beneficiar de maior rapidez nos processos públicos e privados, e de uma abordagem mais prática e ágil na implementação de projetos.

10 – PENSA VOLTAR PARA PORTUGAL? PORQUÊ?

Portugal será sempre o meu país. Gostaria de voltar, eventualmente, para contribuir com a experiência adquirida e ajudar a fortalecer as ligações entre Portugal e os mercados onde tenho atuado. Por agora, continuo a acreditar que posso ser mais útil e relevante fora, como embaixadora informal de Portugal no mundo.