
14 de Abril de 2025
Reunião do Conselho Consultivo | Abril 2025
No dia 10 de abril, o Conselho da Diáspora Portuguesa realizou a sua primeira reunião do Conselho Consultivo de 2025, no Hotel Pestana Palácio do Freixo, no Porto.
27 de Fevereiro de 2024
“Para aceder ao Brasil importa agir com humildade”
Portugueses que se destacam lá fora ajudam a descobrir onde estão oportunidades de negócios e que tipo de empresas e atividades o país pode atrair. Uma iniciativa que junta o Negócios e o Conselho da Diáspora Portuguesa.
1. O que o levou a sair de Portugal?
No meu caso, a decisão de ter uma experiência internacional aconteceu já numa fase tardia da minha carreira professional, passada essencialmente em Portugal. Bem diferente, pois, das razões que têm motivado os nossos jovens a partir nos últimos anos. Diria que foram essencialmente dois motivos. Em primeiro lugar, o desejo de crescimento professional através de uma experiência professional de gestão num ambiente internacional, com horizontes mais amplos e desafios de diferente natureza. Adicionalmente, e depois de ter desenvolvido a maioria da minha carreira em diversas posições no sector da banca, a última das quais como Administrador-executivo no Banco Montepio, tive o ensejo de poder dar um contributo professional que não fosse centrado exclusivamente na rentabilidade das operações, mas que contivesse um propósito maior. E, para tal, considerei que a melhor opção seria fazer parte dum banco de desenvolvimento com impacto em países emergentes. Foi assim que me decidi candidatar à IFC International Finance Corporation, o banco, dentro do Banco Mundial, que tem por missão investir e financiar o sector privado e os projetos que promovem o crescimento sustentável. Nesse processo de candidatura, tive a felicidade de ser escolhido para gerente geral do banco no Brasil.
2. Que vantagens ou desvantagens lhe trouxe o facto de ser português?
Na verdade, acho que tenho principalmente sentido vantagens, resultantes da reconhecida versatilidade e fácil adaptabilidade a outros ambientes e culturas que, em geral, caracteriza os portugueses no estrangeiro. Atualmente, a qualidade dos gestores e técnicos portugueses tem grande reconhecimento internacional, e isso facilita a integração. Por outro lado, a opinião que os brasileiros têm de Portugal melhorou muito nos anos mais recentes, havendo maior sentimento de proximidade e respeito.
3. Que obstáculos teve de superar e como o fez?
Diria que o primeiro obstáculo foi aquilo que se costuma chamar por “sair da zona de conforto”, i.e., ter o atrevimento e coragem para mudar e partir para o desconhecido. O segundo embate foi conseguir adaptar-me a um novo ecossistema. De repente, tudo é novo, desde a organização aos colegas, passando pelo país e sua cultura. No meu caso concreto, um dos desafios mais importantes foi adaptar-me a uma instituição que tem um modelo de gestão e cultura moldadas muito ao estilo das organizações norte-americanas, em particular onde o relacionamento pessoal tem menos relevância que nas culturas latinas. Esta experiência profissional forçou-me a rever padrões de comportamento e fazer mudanças para poder navegar e ter sucesso. No fundo, trata-se de incorporar o que dizia Charles Darwin sobre a evolução das espécies “as que sobrevivem não são as mais fortes nem as mais inteligentes, mas as que tem maior capacidade de adaptação”. Estar sempre pronto para aprender e ajustar-se torna-se essencial.
4. O que mais admira no país onde está?
Em breve vai fazer quatro anos que cheguei ao Brasil e muito rapidamente compreendi que tinha de pôr de lado os (pre)conceitos que tinha do país e dos brasileiros, se de facto queria ter uma melhor compreensão do país real. Um dos primeiros impactos é perceber que o Brasil, mais do que um país, é um verdadeiro continente, em dimensão geográfica (o Brasil tem 3 fusos horários), populacional e diversidade. Essa dimensão gigantesca muda todas as perspectivas, desde logo porque as dimensões espaço e tempo são outras. Nos negócios, costumo dizer que o Brasil é um país onde as coisas acontecem e se tornam realidade, sempre e quando se tenha um business case sólido e credível. Os brasileiros têm uma forte cultura de empreendimento e gosto por realizar, são curiosos e inovadores e não temem o risco. Na medida em que há menos restrições do que na Europa, o interesse gerado rapidamente evolui para algo de mais concreto. Noutra dimensão, o Brasil é um colosso em termos culturais, de diversidade social e ambiental sem paralelo no mundo.
5. O que mais admira na empresa ou organização onde está?
Posso dizer que já conheço bem a casa onde estou e admiro sobretudo cinco pilares: (i) em primeiro lugar, ter como missão promover a prosperidade compartilhada num planeta sustentável; (ii) ser um banco que investe sempre com um objetivo de gerar impacto relevante em termos de desenvolvimento sustentável, quer em termos económicos, sociais ou ambientais; (iii) ser uma organização que também é uma power house em termos de conhecimento e experiência, onde posso ir buscar exemplos de sucesso na Índia ou China, mas também exportar os casos de sucesso aqui do Brasil para outras geografias; (iv) o modelo organizacional e a eficiência de processos, a clara definição estratégica, o foco nos resultados e no impacto; e, finalmente, (v) uma cultura corporativa que promove o crescimento pessoal e professional sempre assente na meritocracia.
6. Que recomendações daria a Portugal e aos seus empresários e gestores?
Os portugueses tendem a olhar o mercado brasileiro como uma extensão de Portugal, proporcionando uma falsa sensação de facilidade, o que não é bem verdade. A entrada no mercado brasileiro é tão desafiadora como qualquer outro mercado emergente. Desde logo, para ter sucesso deve-se estruturar o negócio num horizonte de longo prazo, assente em premissas razoáveis e credíveis. Investir na governança, eficiência e numa cultura de inovação da empresa, é um fator competitivo relevante. Para aceder ao Brasil, é importante agir com a humildade de perceber que o Brasil tem muito para ensinar, e, nessa medida, dever-se-á investir em desenvolver um profundo conhecimento do mercado e das idiossincrasias do país e, eventualmente, considerar encontrar um parceiro local que permita a implantação e desenvolvimento do negócio de forma segura.
7. Em que setores do país onde vive poderiam as empresas portuguesas encontrar clientes?
Seguramente nos sectores do agronegócio, infraestruturas, energias renováveis, turismo e consultoria. Devo dizer que, no exercício das minhas funções professionais, tenho sempre procurado guiar e ajudar as empresas portuguesas que procuram posicionar-se no mercado brasileiro.
8. Em que setores de Portugal poderiam as empresas do país onde vive querer investir?
O Brasil tem vindo a aumentar os seus investimentos em Portugal nas áreas do imobiliário e turismo, aeronáutica, vinícolas, mas creio que facilmente se pode estender a outras áreas. Há já muitos anos que se fala de posicionar estrategicamente Portugal como um hub para entrada na Europa de empresas de países latino-americanos e africanos. Em minha opinião, este desígnio faz todo o sentido, mas encontra-se ainda por cumprir. Portugal tem agora uma nova oportunidade assente na temática da transição energética. O Brasil começa a posicionar-se como grande produtor e exportador de energia verde (hidrogénio verde, amónia e biocombustíveis), sendo a Europa um dos importadores de eleição. Portugal deveria apostar em criar as plataformas necessárias à entrada destas novas fontes de energia vindas do Brasil para a Europa, à imagem do que a Holanda já começou a fazer.
9. Qual a vantagem competitiva do país em que vive que poderia ser replicada em Portugal?
Destacaria a existência de um mercado de capitais desenvolvido e dinâmico que promove e apoia o investimento privado. O governo brasileiro montou um sistema de incentivos fiscais para investidores privados ou institucionais que comprem obrigações de empresas com projetos de infraestrutura e energia, o que tem gerado um grande crescimento e diversificação das fontes de financiamento para as empresas e seus projetos.
10. Pensa voltar a Portugal? Porquê?
Ainda tenho alguns anos de atividade professional pela frente, mas está nos meus planos regressar e com vontade de alavancar esta experiência internacional para melhor contribuir para o desenvolvimento de Portugal. Como bem disse o presidente norte-americano J.F. Kennedy, nenhum de nós se pode demitir de pensar o que pode fazer pelo nosso país.